Morta a facadas na Itália, transexual cearense planejava voltar a morar em Fortaleza


Manuela de Cássia foi morta em casa, em Milão, na última segunda-feira. Antônio mostra foto ao lado de Manuela.
Isaac Macêdo/SVM
A cearense Manuela de Cássia, assassinada a facadas na Itália na última segunda-feira (20), planejava deixar de fazer programas e voltar definitivamente para Fortaleza. As informações são de Antônio Teixeira Neto, amigo da artista transexual.
Antônio, que trabalhou como profissional do sexo com Manuela em São Paulo e a conhecia desde a década de 1990, afirma que ela se preparava para voltar ao Brasil.
“Ela voltava sempre para Fortaleza e vinha vislumbrando a possibilidade de encerrar as atividades e se instalar aqui, reabrir um centro de estética. Ela já se mostrava cansada e dizia que já estava se organizando para isso”, lembra.
O amigo narra, além do luto, a inconformidade em ter a amiga assassinada depois de enfrentar, durante décadas, os perigos que cercam uma profissional do sexo. “Ela sobreviveu a 30 anos de exposição. Ficamos chocados. É como se ela nadasse, nadasse e morresse na praia. Já quando ela encerrava [a carreira] acontece esse crime.”
Manuela de Cássia, artista trans cearense encontrada morta na Itália
Arquivo Pessoal
Apesar das incertezas sobre o que aconteceu na noite do crime, que é investigado pela polícia italiana, Antônio destaca a vontade de que o caso seja solucionado e o suspeito, identificado e preso.
“Foram 80 facadas por parte do assassino, foi um crime de ódio. Precisamos atentar a esse detalhe, onde o agressor se sente dono do corpo do outro e se acha no direito de se dispor do corpo da vítima”, lamenta o amigo.
“Não sabemos exatamente [o que aconteceu]. Talvez ele quisesse prolongar a noite e ela talvez tenha recusado a permanência dele. Como pessoas que amávamos ela, esperamos que a polícia tenha a sorte de encontrar instrumentos para que ele seja pego e pague pelo que cometeu. É uma sede de justiça, mas trocaríamos essa justiça pela volta dela, pela presença dela”, desabafa o amigo.
Ele afirma ainda que Manuela era uma mulher gentil e muito acolhedora. “Ela deixou um exemplo de tolerância e acolhimento. Ela não admitia pessoas apontando o dedo para defeitos alheios. Ela dizia que tínhamos que acolher as pessoas”.
Morte e traslado do corpo
Manuela de Cassia foi morta dentro do próprio apartamento, em Milão, na Itália. A vítima foi encontrada após os vizinhos sentirem um forte cheiro de gás vazando no local onde aconteceu o crime, segundo informam jornais italianos.
Uma das hipóteses é que Manuela tenha sido assassinada por um cliente durante uma briga, no fim de um atendimento. Conforme a polícia italiana, ela trabalhava como acompanhante e, algumas vezes, chegava a receber clientes em casa.
A Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS) do Ceará se solidarizou com a família e amigos da artista transexual e informou, em nota que, “por meio da Coordenadoria de Políticas Públicas para LGBT, está em contato com o Ministério da Cidadania solicitando o acompanhamento e as providências a serem tomadas pelo órgão federal”.
Conforme Antônio, a família e amigos esperam que o corpo possa ser mandado para o Brasil, para que haja a devida despedida de Manuela. “O coordenador Especial de Políticas Públicas para LGBT do Ceará, Narciso Júnior, entrou em contato com a família e está buscando meios de prestar assistência para promover o traslado. Estamos aguardando os trâmites burocráticos e gostaríamos muito que as autoridades competentes enxergassem o caso com sensibilidade para que os familiares possam enterrá-la aqui, como ela merece”.
“É uma angústia que se prolonga por termos a consciência de que leva um tempo para que haja uma solução, já que há uma investigação em curso. É algo que vai nos consumindo. Quanto antes as autoridades competentes resolverem, melhor nos sentiríamos”, pede o amigo.
Suporte financeiro
Manuela ajudava financeiramente a família de Fortaleza, pagando planos de saúde, faculdade para a irmã e escola de sobrinhos. Ela foi Miss Pantera Gay em 1997 e ainda se apresentou em programas de TV, como o do apresentador Raul Gil.
A artista vivia na Itália há mais de duas décadas. A irmã dela, Lisieux Alves, afirmou que Manuela trabalhava como profissional do sexo na Europa, já foi cabeleireira em Fortaleza e deixou imóveis na capital cearense a serem administrados pela família.
“Ela era muito família, me criou desde os meus 18 anos, tinha meus dois filhos como dela, me sustentava desde que tenho 18 anos, [pagava] minha faculdade, colégio da minha filha, meu plano de saúde, o do meu filho. Já passei por 20 cirurgias, ela nunca deixou faltar nada, ela ajudava os sobrinhos. Nunca imaginei que uma pessoa fosse capaz de fazer isso…ela tava cheia de planos”, lamenta a irmã.

By Samanta Abdala

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